sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Copacabana

Hoje é inverno no bairro.

São dez e dez da manhã e a quentura imprópria da estação que invade o espaço entre as venezianas antigas é quase o pretexto pra não te dar um toque sem que haja um contexto. Um toque que seja. Um toque que te invada a bermuda esgarçada por minha causa. Seu número não tenho mais. Um toque que te arrombe a casa. Os ossos. Seus pés intranquilos. Você calçava os chinelos e se arrastava pelo calçadão fervente como os seus olhos. Não falarei sobre seus olhos e nem do inferno. O bairro é preguiçoso e enferruja dentro dos porquês elaborados com a saudade que você me fez traduzir enquanto tomava uma gelada na Siqueira Campos. Aquela rua te traduz também. Exausta. Um cubículo. Prédios enfermos e um porteiro banguela que insistia em me sorrir quando voltava encharcada do choro salgado. Do suor que te impregnava o pescoço quando retornava das longas caminhadas no calçadão dançante do seu bairro hospedeiro. Eu não sei nadar. Eu não contei os minutos de apneia dentro das suas calças. É abafado. É rígido. O bairro é impróprio também. Siqueira Campos eu nem sei quem foi mas hoje é saudade. Hoje é inverno na cidade e o inferno perto do caos de sua íris é mais denso do que a estação em frente à sua janela. O metrô da Siqueira é sempre muito azul. Não vou falar sobre os seus olhos. Talvez sobre o gozo ainda em meu passado. Dos passos contados até a Barata Ribeiro pra mais um cigarro e uma gelada não é tão gelada assim depois de conhecer a Siqueira Campos. O barulho do vagão em despedida. O cheiro velho da saudade de um bairro insosso e invernal.

2 comentários:

  1. Poesia, vinho e cerveja, seja o que seja, o mundo é velho, insosso e invernal, o mundo é um bem e um mal, que cabe em cada frase dos teus poemas, cabe em tua cintura pura de bem - gostosura e de mal - travessura, o mundo em Copacabana é uma mistura da cor da tua cintura e da essência de toda flor da Amazônia. E teu poema é uma cantata para toda a mulher que se faz ser admirada.. E tu é.
    Bom fim de semana.

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  2. Li em uma tacada só e é de perder o fôlego, tamanho o calor que irradia de suas palavras incandescentes, Gyzelle. Adorei.

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