segunda-feira, 21 de abril de 2014

Só você nessa poesia

Antes fosse o amor traiçoeiro sua chaga
eu arrebentaria a corrente que urge esse abominável
mas essa não é causa do seu martírio
e da dor que tanto suporta

Antes piedade eu tivesse dos seus lábios ausentes
muito taciturnos a dançarem palavras
que escorrem débeis pelas laterais ressecadas
devido ao inverno que chegou mais cedo

E se eu sentisse ódio não me espantaria
clamaria aos céus que sua morte chegasse
para aliviá-la dessa tonelada de fracassos

Antes fosse tarde demais para te querer
e as mulatas de Ipanema me roubassem a atenção
mas estou enjaulado na teia de um labirinto
bebericando seu desprezo

Antes a perca de algo ou alguém fosse a causa da sua agonia
mas nada te falta a não ser a si mesma, abortou-se, dissipou-se
em meio a um vale fúnebre
de faces invisíveis

Antes eu te fizesse ser mais amor e menos dor
mas eu não sei nem o que posso fazer com essa poesia
que é muito sua ao invés de minha

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Ensaio XX

No fundo, bem no fundo
Eu preciso de um poema recitado sem pressa de acabar
Um carinho que só cale
O barulho que atrapalha a minha paz
Eu gosto de sorrisos que suturem os pontos
Recém costurados das feridas que transporto
Quero prosa e poesia sem técnica
E morangos expostos ao sol na feira de quinta
Uma gordurinha na barriga, livro de bolso debaixo do braço,
O suor traçando caminho pela coluna, mistérios da língua,
As unhas da mãos roídas até o limite, pés feios
Só preciso guardar esse segredo de todos, marujo
Ser tão durona machuca às vezes
Mas dá para suportar se as ondas não quebrarem
O que já está estilhaçado
Ou se o moço que vende rosas não descobrir
Meu olhar dócil de primavera
Pois vai querer roubar
Oh, rapaz, eu tenho tão pouco!